Como se enxergar “tal como se é” — A mulher junto ao poço

Judeus e samaritanos eram inimigos desde 722 a.C., quando os assírios conquistaram as dez tribos de Israel e deportaram todas as pessoas, exceto os mais pobres, para outras terras e trouxeram estrangeiros para Israel a fim de comprometer a identidade do povo (2Re 17.5,6,23,24).

João faz uma menção geográfica interessante. Uma consulta a um mapa de Israel dos tempos do Novo Testamento mostra a província da Galileia ao norte, a província da Judeia ao sul e a região de Samaria entre as duas. Parece lógico que alguém indo da Judeia à Galileia atravessasse Samaria. No entanto, a maioria dos judeus se recusava a caminhar sobre solo samaritano e, para evitá-lo, faziam uma rota quase duas vezes mais longa do que o caminho por Samaria.

Os samaritanos e os judeus se odiavam. Mesmo assim, a Bíblia afirma que Jesus “teve de passar por Samaria” (v.4). Cansado, Jesus sentou-se ao lado de um poço em Samaria. Ali, debaixo do sol forte do meio-dia, Ele observou a mulher que se aproximava com um jarro no ombro.

Pouco se sabe sobre essa mulher, a não ser que ela fora casada cinco vezes e que vivia com alguém que não era seu marido. Não sabemos o que acontecera com os cinco relacionamentos anteriores. Porém, uma coisa é certa: se algum de seus casamentos foi desfeito pelo divórcio, não partiu dela, pois apenas os maridos poderiam pedir o divórcio. Era parte da Lei de Moisés sob a qual tanto judeus quanto samaritanos viviam (Dt 24.1-4).

O ponto de vista da escola rabínica de Shammah era rigoroso e ensinava que apenas alguma ação contrária às leis da virtude — como o adultério — justificaria o divórcio. Mas o discípulo de Shammah, Hillel, ensinava o oposto: “coisa indecente nela”, qualquer coisa que desagradasse ao marido, como, por exemplo, sal demais na comida. Assim, um homem judeu que quisesse divorciar-se da esposa poderia escolher seguir os ensinamentos do rabi Hillel se lhe fosse conveniente.

A mulher no primeiro século não podia forçar o marido a lhe dar uma certidão de divórcio para que ela se casasse novamente, e sobreviver como solteira era impossível. Assim, essa mulher que se aproximava do poço pode ter lutado com isso. Se o seu último marido tivesse recusado a lhe dar a carta de divórcio, ela pode ter-se visto obrigada a viver com um homem com quem ela não estava livre para se casar.

Jesus a observou em seu trajeto rumo ao poço, na hora mais quente do dia. A maioria das mulheres ia ao poço pela manhã ou no fim da tarde, quando estava mais fresco. Será que essa mulher escolheu buscar água imaginando que ninguém mais estaria ali na tentativa de evitar as pessoas da cidade que a tratavam com desdém? Ao aproximar-se, viu Jesus sentado junto ao poço. Quem era Ele? Apenas as mulheres buscavam água, com exceção dos pastores que retiravam água para seus rebanhos. Mas evidentemente aquele homem não era um pastor. Ele estava vestido com uma túnica longa e branca como a dos rabis ou mestres. E o mais surpreendente, Ele lhe dirigiu a palavra. Com isso, Jesus infringiu dois fortes costumes hebraicos.

Primeiro, um judeu não falava em público com mulheres. Se o homem fosse um rabi ou líder religioso, ele nem sequer poderia cumprimentar a própria esposa ao passar por ela na rua. Alguns fariseus eram chamados de “fariseus feridos e ensanguentados” porque, sempre que viam uma mulher em público, fechavam os olhos. Não é de se surpreender que, às vezes, eles arremessavam-se nos muros, ferindo a si mesmos. Segundo, Ele utilizou-se do copo de uma desprezada mulher samaritana.

Qualquer outro homem naquele dia teria ignorado a mulher samaritana. As barreiras de raça, religião, sexo, caráter e posição social eram grandes demais. Porém, Jesus era diferente! Ele não se limitava aos costumes da época. Escolhera passar por Samaria e descansar ali, pois uma mulher solitária precisava ouvir a Sua palavra de esperança. 

Para iniciar a conversa, Jesus lhe pede água, e essa mulher reage com surpresa: “Como é que me pede água para beber?” (v.9). O Senhor não a responde, mas faz uma declaração intrigante (v.10). Que tipo de enigma era esse? O homem lhe pediu água e, em seguida, diz que tem “água viva” e que ela poderia pedir-lhe.

A água era só um pretexto para Jesus chegar ao que tinha em mente: despertar na mulher a consciência de sua necessidade e da disposição de Deus de atendê-la. Então, Ele lhe revela duas coisas: ela não conhecia o presente que Deus tinha para ela e tampouco ela sabia com quem estava falando.

A samaritana o questiona de onde Ele tiraria essa “água viva” e se Ele era mais importante do que Jacó, que lhes havia dado aquele poço. Água “viva” era mais desejável do que qualquer outra água, pois procedia de uma nascente ou fonte. O poço de Jacó tinha água boa, mas não água corrente ou água viva. Na sequência, Jesus lhe afirma que quem bebesse da água daquele poço sempre voltaria a ter sede, mas quem bebesse da água que Ele próprio oferecia jamais teria sede novamente. 

Na essência da declaração de Jesus, encontra-se a verdade fundamental de que o nosso coração tem sede de algo que só o Deus eterno pode satisfazer. Contudo, essa mulher ainda não tinha chegado nesse ponto. Ela conseguia pensar apenas no suprimento de água que a aliviaria desta viagem diária do povoado até o poço. Assim, para estimular o desejo espiritual na mente da samaritana, Jesus mudou de tópico trazendo à tona a sua condição de não ter marido ainda que vivesse com um homem. Embora a mulher não tivesse percebido, Jesus estava começando a lhe dar água viva.

Jesus não a julgou nem a insultou. Ele simplesmente confirmou que ela falara a verdade, ainda assim, tirou-lhe a máscara. Em sua constrangedora situação diante de Jesus, ela se viu como o Senhor a via, “tal como ela era”.

Jesus revelou que conhecia toda a verdade sobre a vida dela, e imediatamente a mulher conjecturou se Ele seria um profeta. Nesse momento, ela levanta a questão sobre o verdadeiro local de adoração. O rabi judeu e a mulher samaritana estavam conversando à sombra dos dois grandes montes, Ebal e Gerizim, onde os samaritanos realizavam sua adoração. Sua ansiedade por ter o seu pecado revelado pode tê-la impulsionado a levar a sério sua religião.

Jesus não fez questão de retomar a conversa sobre os maridos da mulher nem sobre o atual relacionamento dela. Em vez disso, Ele levou sua preocupação a sério e a respondeu pedindo para que cresse no que Ele falava. Jesus descartou os locais físicos como centros de adoração e afirmou que a verdadeira adoração provém de adoradores que adoram a Deus “em espírito e em verdade” (vv.21-24).

A samaritana tinha em mente a religiosidade exterior, mas Jesus queria que ela compreendesse a adoração interior. Que por estar preocupada com o lugar de adoração, ela tinha negligenciado a razão da adoração: Deus. Assim, revelando-lhe o que era realmente importante, Jesus a afastou dos montes sagrados, dos templos e dos rituais.

O Messias estaria desperdiçando tempo conversando com uma mulher ferida em sua alma? Como ela poderia duvidar da Sua palavra? Ele dissera coisas sobre ela que apenas um profeta de Deus poderia saber. A samaritana não compreendia tudo o que Ele dissera, mas sabia que, de alguma maneira, poderia crer nele. Em seu encontro com Jesus, ela fez a jornada rumo à fé. E tinha entendido o suficiente para motivá-la a compartilhar as boas-novas com outras pessoas. Na sequência descobrimos que muitos samaritanos creram em Jesus ao se encontrarem com ele.

Não sabemos no que se transformou a vida dessa mulher. Sabemos que Jesus não a condenou. O Mestre simplesmente permitiu que ela soubesse que Ele a conhecia profundamente. Jesus discipulou a mulher no poço de Jacó ao levá-la a aceitar os fatos de sua vida tais como eram.

Nossa sede mais profunda jamais será satisfeita até que conheçamos a Deus, que é a água para a terra seca. Não podemos conhecer o Senhor até que nos enxerguemos e reconheçamos nossos pecados. Mesmo assim, podemos passar uma vida toda encobrindo o que realmente somos. Não podemos nos esconder, colocar uma máscara nem brincar de fingir. Jesus conhece nosso interior. O mais surpreendente é que, apesar de nos conhecer profundamente, Ele nos ama.

Quando compreendermos isso, Jesus começará a nos dar água viva. Pois Ele é a água viva que transforma e sustenta a vida.

Um ano com as mulheres da Bíblia

Artigo retirado de trechos do livro

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Artigo retirado de trechos do livro

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